Where Do We Go Now! Rosângela Rennó
© Rosângela Rennó
Interview: Rosângela Rennó and Rui Goncalves Cepeda
Rui G. Cepeda: Em Arquivo Geral, bem como em outros projectos fotográficos anteriores, o que trazes não é uma adição visual, é o oposto, há um apagar (um suprimir quer da imagem, que governa os modos de vida na sociedade contemporânea, quer do espaço, que determina o nosso posicionamento sócio-cultural, por exemplo).
É a tua intenção com o posicionamento de este discurso causar uma identificação social com o irresolvido (por oposição à não neutralidade da história/memória e à neutralidade do arquivo)?
Rosângela Rennó: Acho que o a possibilidade de um "posicionamento de identificação social com o irresolvido, etc…" é uma avaliação muito boa e perspicaz. Entretanto ela é sua, não é minha. Se eu dissesse pra vc, que desde o primeiro trabalho com 'apagamentos' ou 'amnésias', tinha isso como questão primordial, estaria mentindo. Na verdade, quando comecei a tratar das 'amnésias' em meus projetos (talvez tenham sido o Imemorial e o In Oblivionem, ambos de 1994) havia um desejo de mimetizar, de copiar a sobra daquilo que de alguma forma denuncia ou denota o apagamento, o esquecimento ou o abandono. Esse gesto sempre significou, para mim, a resistência ao esquecimento. Essa era a minha obsessão; a clareza sobre a extensão desse gesto e o entendimento do seu alcance só vieram muito depois.
RGC: O corpo de trabalho que tens desenvolvido ao longo dos anos surge enquadrado por um contexto visual encontrado no ambiente circundante, mas também é suportado por uma pesquisa sobre o património histórico e sobre a memória visual de uma determinada geografia. Qual foi o contexto particular para que A01 [cod. 19.1.1.43] - A27 [s|cod.23] surgisse?
RR: Em 2009 eu planejei criar uma trilogia de livros de artista, a partir da documentação dos casos de furtos a importantes coleções de fotografias históricas, ocorridos entre 2005 e 2007. Meu primeiro alvo foi o furto sofrido pela Biblioteca Nacional, em 2005, basicamente pelo mesmo grupo de ladrões que roubou o Arquivo Geral, no mesmo ano e gerou o primeiro projeto de livro de artista (em versões offset e álbum), intitulado 2005 – 510117385 – 5. Cada projeto de livro foi desenvolvido com os recursos visuais disponíveis, isto é, com os diferentes vestígios que cada coleção deixou. O resultado são livros com mesmo formato mas com 'recheios' totalmente diferentes. Nos moldes de uma 'coleção' dentro de uma editora. Um terceiro projeto, portanto, será produzido entre 2015 e 2016 mas ainda está em estudo.
RGC: O que ainda é mais relevante é que os livros surgem como mais um elemento não adicional, mas de relevância na tua prática como fotógrafa. O que é que alimenta este fascínio por conceberes livros de artista?
RR: Primeiramente, o seu caráter democrático. Posso criar uma obra com edição mais ampla e oferecer a um público por um valor mais acessível do que um objeto único. Além do mais, para mim, a estrutura do livro é como um 'sitio' com a qual a obra tem que dialogar. Páginas de livro são equivalentes a paredes de um espaço, mas o artista tem que ter controle das ferramentas gráficas para isso tudo funcionar. O fascínio está aí, lidar com esses condicionantes e criar algo potente.
RGC: Ao apresentares A01 [cod. 19.1.1.43] - A27 [s|cod.23] na forma de livro, ao invés de na forma de exposição, por exemplo, podemos perceber que existe uma preocupação tua com a democratização do sensível?
RR: Touché!
RGC: Quais os novos projectos e desafios que tens pela frente?
RR: Tenho tantos projetos em vista que fica até difícil de falar sobre eles, já que isso pressuporia uma hierarquia que ainda não existe. Gosto de tocar uns 4 projetos ao mesmo tempo e ainda ter 4 orbitando no teto do meu atelier.